"O objeto próprio da história consiste, antes de tudo, no conhecimento dos relatos verdadeiros, no seu teor real, e em seguida na indagação por quais razões fracassou ou triunfou aquilo que foi dito ou aquilo que foi feito(...) se negligenciarmos os discursos verdadeiros e os que lhe deu origem, substituindo-os por argumentações falaciosas e por extensões retóricas, nada mais fazemos que suprimir o objeto da história." Políbio, História.(século II a C)
sábado, 26 de maio de 2012
A Guerra de Canudos, 3
sexta-feira, 25 de maio de 2012
A Guerra de Canudos, 2
A Guerra de Canudos 1
Abaixo, um trecho do livro Os Sertões, de Euclides da Cunha que faz uma síntese do vídeo acima.
"Viu a República com maus olhos e pregou, coerente, a rebeldia contra as novas leis. Assumiu desde 1893 uma feição combatente inteiramente nova.
Originou-a fato de pouca monta.
Decretada a autonomia dos municípios, as Câmaras das localidades do interior da Bahia tinham afixado nas tábuas tradicionais, que substituem a imprensa, editais para a cobrança de impostos etc.
Ao surgir esta novidade Antônio Conselheiro estava em Bom Conselho. Irritou-o a imposição; e planeou revide imediato. Reuniu o povo num dia de feira e, entre gritos sediciosos e estrepitar de foguetes, mandou queimar as tábuas numa fogueira, no largo. Levantou a voz sobre o "auto-de-fé", que a fraqueza das autoridades não impedira, e pregou abertamente a insurreição contra as leis.
Avaliou, depois, a gravidade do atentado.
Deixou a vila, tomando pela estrada de Monte Santo, para o norte.
O acontecimento repercutira na capital, de onde partiu numerosa força de polícia para prender o rebelde e dissolver os grupos turbulentos. Estes naquela época não excediam a duzentos homens. A tropa alcançou-os em Maceté, lugar desabrigado e estéril entre Tucano e Cumbe, nas cercanias dás serras do Ovo. As trinta praças, bem armadas, atacaram impetuosamente a turba de penitentes depauperados, certas de os destroçarem à primeira descarga. Deram, porém, de frente, com os jagunços destemerosos. Foram inteiramente desbaratadas, precipitando-se na fuga, de que fora o primeiro a dar o exemplo o próprio comandante.
Esta batalha minúscula teria, infelizmente, mais tarde muitas cópias ampliadas."
Trecho de Os Sertões, de Euclides da Cunha.
sábado, 28 de abril de 2012
O STF diz que a discriminação é constitucional.
A discriminação racial no Brasil é constitucional, segundo decidiram por unanimidade os ministros do Supremo Tribunal (STF), num julgamento sobre a adoção de cotas para negros e pardos nas universidades públicas. Com base numa notável mistura de argumentos verdadeiros e falsos, eles aprovaram a reserva de vagas para estudantes selecionados com base na cor da pele ou, mais precisamente, na cor ou origem étnica declarada pelo interessado. Mesmo enfeitada com rótulos politicamente corretos e apresentada como “correção de desigualdades sociais”, essa decisão é obviamente discriminatória e converte a raça em critério de ação governamental. Para os juízes, a desigualdade mais importante é a racial, não a econômica, embora eles mal distingam uma da outra.
segunda-feira, 23 de abril de 2012
Os Projetos de República
Os dois Projetos de República.¹
No mesmo sentido, ensina-nos Boris Fausto que "como episódio, a passagem do Império para a República foi quase um passeio", aludindo certamente ao fato de que não houve comoção popular nem crises de instabilidade causadas pelo Golpe do Exército.
Toda essa calmaria, entretanto, logo logo cederia lugar a um período de instabilidade política, como revoltas militares, crise econômica, revoltas no campo e nas cidades. Se a Proclamação da República em si, não sacudiu o país, os primeiros 15 anos do regime foram marcados por sérias crises políticas e sociais.
Em primeiro lugar é fundamental que a gente lembre que os grupos que defendiam o regime republicano não eram homogêneos nem tinham a mesma visão sobre a organização do novo regime. Grosso modo havia duas visões opostas: a dos militares - e aqui falo do exército - e a dos grandes proprietários, sobretudo dos cafeicultores. Os primeiros defendiam um modelo republicano baseados nas ideias do positivismo e os os outros tinham uma visão mais liberal, próxima da república norte-americana, conhecida como federalismo.
Estou, meus caros, a simplificar as divergências, haja visto que mesmo entre os militares havia importantes diferenças, e entre os cafeicultores também; contudo, numa visão abrangente, as ideias positivistas e federalista, confrontavam-se no debate sobre o modelo de República que deveria ser implantado no Brasil. Este post tem como objetivo tratar desses dois projetos de república.
Os positivistas
Boris Fausto nos ensina que apesar do positivismo estar ligado aos oficiais do exército brasileiro, havia civis, como os republicanos gaúchos, que defendiam o projeto positivista . Por outro lado, os dois primeiros presidentes do Brasil, que foram militares, o Marechal Deodoro e o Marechal Floriano Peixoto não eram exatamente entusiastas do positivismo. O primeiro imaginava que com a República o exército passaria a ter mais prestígio e reconhecimento do que tinha com a Monarquia, assumindo um papel importante nos destinos do país. O segundo, embora não fosse positivista, estava cercado por jovens oficiais da Escola Militar que defendiam com ardor as idéias do positivismo. Esses jovens oficiais concebiam que a missão dos militares era dar um sentido aos rumos do país. A República deveria garantir a ordem e o progresso do Brasil. Eles entendiam como progresso a "modernização da sociedade através da ampliação dos conhecimentos técnicos, do crescimento da indústria, da expansão das comunicações"²
Em que pese as diferenças entre o "grupo" de Deodoro e o "grupo" de Floriano, o fato de pertencerem ao exército lhes dava um sentido de aproximação. De forma geral acreditavam num Poder Executivo forte, numa inevitável ditadura militar e viam o exército como uma instituição incorruptível, defensora por princípio dos interesses nacionais, numa palavra: patriótica. Desconfiavam da ideia liberal de conceder autonomia às províncias, primeiro porque enxergavam nesse fato os interesses particulares dos grandes proprietários e depois porque imaginavam que a autonomia das províncias traria de volta o risco da fragmentação territorial do país.³
Os Grandes Proprietários
O historiador Marco Antônio Vila nos revela que em agosto de 1889 a eleição para a câmara elegeu apenas dois representantes do Partido Republicano. Os demais eram dos partidos que sustentavam a Monarquia: o Conservador e o Liberal. Como, pergunta Vila, em três meses, todo o apoio político que sustentava o imperador se esvaneceu? Uma das explicações, segundo o professor da UFSCar está na ideia de que com a república haveria autonomia das províncias, dando aos grandes proprietários um poder que não conseguiam desfrutar por causa do regime centralizador da monarquia. Isto é, foi sobretudo por conta da possibilidade de conquistarem mais poder nos seus respectivos estados que muitos daqueles que apoiavam o imperador debandaram-se para a causa republicana.
Havia, portanto, entre os defensores da República, dois modelos opostos: o que defendia um governo mais centralizado, e que por isso não via com bons olhos a ideia do federalismo; e aquele que defendia uma importante descentralização política, dando às províncias a autonomia para contrair empréstimos, criar impostos, criar leis, etc.
A luta entre essas duas visões de país vai marcar a história do início da República no Brasil.
1 - Texo publicado originalmente em março de 2010.
sábado, 11 de fevereiro de 2012
As tensões na África na era do Imperialismo*
A QUESTÃO DE SUEZ.

A construção do canal de Suez, na segunda metade do século XIX (1859 -1869), foi uma das grandes realizações de engenharia da época. O canal, construído por uma empresa francesa, tinha como objetivo encurtar as viagens entre o oriente e a Europa, permitindo que as embarcações entrassem pelo mar Vermelho e através do canal passassem para o mar Mediterrâneo; evitando, assim, o longo trajeto que se fazia anteriormente, isto é, atravessando o oceando índico em direção ao atlântico, pelo sul da África, até chegar a Europa.
Houve, desde o princípio, um acordo de que não deveria existir restrição a embarcações de quaisquer países que desejassem passar pelo canal. Contudo, o aumento das tensões diplomáticas entre as potências europeias no final do séculoXIX e início do século XX, obrigou que as potências assinassem compromissos claros para garantir a livre circulação das embarcações. Durante a I Guerra, a Inglaterra que passara a controlar o canal, fechou-o para as nações inimigas.
Desde a inauguração do canal, em 17 de novembro de 1869, o mesmo era controlado pela França e pelo Egito. Contudo, em 1875, o governo inglês comprou do país africano a participação acionária, passando a dividir com a França a administração do canal de Suez. Tal situação gerou uma série de desentendimentos entre as duas potências que só foram solucionados em 1904, quando foi assinado um acordo entre os dois países. Em troca do apoio inglês na conquista do Marrocos, a França abandonaria o Egito, deixando o canal para os ingleses.¹
QUESTÃO MARROQUINA²
Em 1911, a Alemanha partiu para a ofensiva, colocando fim aos anos de hesitação e discrição política. O envio do navio de guerra Pantera a Agadir, no Marrocos, e a conseqüente ocupação da cidade por tropas alemãs foram planejados como uma garantia do lado alemão frente a futuras negociações entre a França e a Inglaterra.
A Convenção de Madri, em 1880, havia assegurado ao sultanato a independência do país. Apesar disso, o Marrocos continuou a ser pelos anos que se seguiram o pomo da discórdia entre as potências européias, em razão das suas ricas reservas naturais.
Também o Império alemão mantinha intensas relações comerciais com o Marrocos. Para a Alemanha, as desavenças entre as potências coloniais França e Inglaterra, em relação à região, vinham até mesmo a calhar. Berlim apresentava-se, de certa forma, como o terceiro envolvido que tirava proveito da questão, enquanto Londres e Paris defrontavam-se com desconfiança mútua, não apenas por causa da questão marroquina.
Essa situação mudou a partir de 1904, após a assinatura da entente cordiale entre a França e a Inglaterra. Nesse acordo, ficaram esclarecidas várias desavenças entre os dois países com relação a diversos territórios espalhados pelo mundo.
O principal ponto do acordo dizia respeito à divisão do norte da África: o Egito foi posto na esfera de interesses de Londres, e Marrocos, na de Paris. Falava-se na época de uma "penetração pacífica" nessas regiões. A Alemanha, por sua vez, viu suas relações comerciais ameaçadas pelo pacto franco-inglês.
Prova de fogo
A primeira crise do Marrocos chegou ao ápice no ano de 1905, quando o imperador Guilherme 2º decidiu viajar a Tânger, com o objetivo de colocar à prova o acordo entre a França e a Inglaterra. O imperador alemão foi recebido com todas as honrarias e fez uma declaração que aludia claramente ao papel da França: "Espero que, sob o domínio do sultão, um Marrocos livre e soberano abra-se para uma concorrência pacífica entre todas as potências européias".
Enquanto isso, na França, disseminavam-se os protestos de indignação. Em Londres e Paris, cogitou-se até mesmo uma intervenção militar contra a Alemanha. O Império Alemão, no entanto, conseguiu impor a sua exigência de uma conferência internacional que discutisse o assunto.
Com ela, a França deveria sentir-se isolada no cenário político e forçada a abandonar a entente. Entretanto, a conferência realizada em abril de 1906 em Algeciras, no sul da Espanha, acabou por provar o contrário: foi a Alemanha que saiu isolada do conflito. Em caso de uma guerra envolvendo o Marrocos, apenas o Império Austro-húngaro estaria do lado dos alemães.
A entente cordiale saiu fortalecida da conferência. Entre outras resoluções, ficou estabelecido que a vigilância policial dos portos marroquinos ficaria a cargo da França e da Espanha. As relações franco-alemãs continuavam estremecidas.
Em 1911, o conflito agravou-se ainda mais com a ocupação da cidade marroquina Fès por tropas francesas. A cidade, sede da monarquia, tornou-se um foco de agitações e tumultos. A independência do Marrocos, assim como tinha sido sublinhada pela Convenção de Algeciras, mostrava ser apenas uma farsa.
O imperador Guilherme 2º comentou, após a ocupação francesa: "A questão miserável do Marrocos tem que ser encerrada rápida e definitivamente. Não há nada mais a fazer, o país vai tornar-se francês. A solução é, então, abandonar o conflito de cabeça erguida".
A barganha
No Ministério alemão das Relações Exteriores, cogitou-se uma troca: Berlim abdicaria de seus interesses no Marrocos e ganharia, com isso, o Congo francês. Para dar força a essa exigência, o navio de guerra Pantera aportou em Agadir, provocando uma verdadeira crise.
A Europa encontrava-se à beira de uma guerra, em função da escalada na crise do Marrocos. França e Inglaterra, parceiros da entente cordiale, uniam-se cada vez mais. Os dois países estavam dispostos a tudo, menos a ceder à pressão alemã.
No final do conflito, Berlim teve de satisfazer-se com um mínimo de exigências. Uma parte do Congo francês, com a superfície de 263 mil km², foi transferida para o Império Alemão em 4 de novembro de 1911.
Em troca, Berlim teve de abrir mão de parte de Camarões, então sua colônia. Um fiasco para a política alemã. As relações entre a França e a Alemanha continuaram estremecidas e trouxeram principalmente uma conseqüência: um desenrolar contínuo da espiral da política armamentista na Europa.
A GUERRA DOS BÔERES (1899-1902)
Os bôeres ou africâners eram os descendentes de holandeses, nascidos na África, e que lutavam por autonomia política em relação aos ingleses que dominavam o sul do continente africano. Em 1852 e 1853, os bôeres tiveram as suas repúblicas, a do Orange e a do Transvaal, reconhecidas como autônomas em relação ao império britânico que dominava a região mais ao sul da África. (Veja o mapa abaixo)
No entanto, as descobertas de minas de ouro e diamantes nas terras bôeres fez o governo britânico mudar sua política em relação a esses colonos e aos nativos, passando a anexar territórios com o uso da força.
Ciosos de sua autonomia, os bôeres travaram uma guerra com os britânicos entre 1877 e 1881 (I Guerra dos Bôeres) e evitaram, nesse momento, a anexação, mantendo a autonomia de suas repúblicas. Contudo, a pressão inglesa voltou a ficar forte no final do século XIX, ocorrendo um novo conflito entre 1899 e 1902 (II Guerra dos Bôeres), dessa vez com a vitória inglesa que acabou transformando as repúblicas do Orange e do Transvaal em colônias britânicas formando assim a União Sul-africana.³
É fundamental entender que as tensões que envolveram as potências européias no continente africano no final do século XIX e início do século XX evidenciam a disputa por territórios - o que na prática significava acesso a minérios, matéria-prima e outras riquezas indispensáveis às potências, além da reserva de mercado que tais colonias se tornariam para esses países. Também é importante ressaltar que as desconfianças mútuas e as animosidades entre as potências intensificaram-se diante dessas disputas por colônias na África.
Notas:
1 - O trecho foi retirado do livro Viver a História, Cláudio Vicentino, editora scipione, pág 197.
2 - Toda a informação contida no post sobre a Questão Marroquina foi retirada deste site. Decidi utilizá-lo na íntegra porque está muito bem explicado.
* Esse texto foi originalmente publicado nesse blog no dia 09 de fevereiro de 2010