sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Hiroshima e Nagasaki - o Horror Atômico




 




 




Em 17 de julho [de 1945], chegou uma notícia de impacto mundial. À tarde, Stimson foi ter comigo na casa em que eu estava hospedado e pôs à minha frente uma folha de papel com as palavras: “Bebês nascidos satisfatoriamente.” Pelo jeito dele, percebi que algo de extraordinário havia acontecido. “Significa”, disse ele, “que a experiência no deserto mexicano deu certo. A bomba atômica é uma realidade.” (...) Nenhum cientista responsável dispunha-se a prever o que aconteceria quando fosse testada a primeira explosão atômica completa. Seriam essas bombas inúteis, ou teriam um efeito aniquilador? Agora sabíamos. Os “bebês” haviam “nascido satisfatoriamente.” Ninguém ainda era capaz de medir as consequências militares da descoberta, e ninguém até hoje mediu nada mais sobre ela.

Na manhã seguinte, chegou um avião com a descrição completa desse evento aterrador na história humana. (...) A bomba, ou um seu equivalente, fora detonada no alto de uma torre de cem pés de altura. Todos tinham sido retirados num raio de dez milhas, os cientistas e suas equipes abaixados atrás de paredes e abrigos de concreto maciço, mais ou menos a essa distância. A explosão foi aterradora. Uma imensa coluna de chamas e fumaça projetara-se par a fímbria da atmosfera de nossa pobre Terra. Devastação absoluta num raio de uma milha. Ali estava, portanto, um fim veloz para a Segunda Guerra Mundial, e talvez para muitas outras coisas.

O Presidente [Truman] convidou-me a conversar com ele logo em seguida. (...) Até aquele momento [ antes da obtenção da bomba] havíamos organizados nossas ideias em torno de um ataque à nação japonesa por meio de um terrível bombardeio aéreo e da invasão por exércitos imensos. Havíamos considerado a resistência desesperada dos japoneses, lutando até a morte com devoção de samurais, não apenas em batalhas acirradas, mas em cada gruta e abrigo. Eu guardava a lembrança do espetáculo da ilha de Okinawa, onde muitos milhares de japoneses, em vez de se renderem, haviam-se dispostos em fileiras e se destruído com granadas de mão, depois de seus comandantes haverem solenemente praticado o ritual do hara-kiri [suicídio]. Sufocar a resistência japonesa homem a homem e conquistar o país palmo a palmo bem poderia exigir a perda de um milhão de vidas americanas e metade desse número em vidas inglesas. – ou mais, se conseguíssemos levar os homens até lá, pois estávamos decididos a compartilhar dessa agonia. Agora, todo esse quadro de pesadelo havia desaparecido. Em lugar dele estava a visão – realmente clara e luminosa, ao que parecia – do término de toda a guerra em um ou dois impactos violentos. De minha parte, ocorreu-me imediatamente que o povo japonês, cuja coragem eu sempre admirara, poderia encontrar no surgimento dessa arma quase sobrenatural um pretexto que lhe salvasse a honra e o libertasse da obrigação de ser morto até o último combatente.

Além disso, não precisaríamos dos russos. O fim da guerra japonesa já não dependia da entrada profusa de seus exércitos para a matança final e talvez demorada. Não tínhamos necessidade de lhe pedir favores. (...) De repente, parecíamos ter ficado de posse de uma abençoada abreviação da carnificina no Oriente e de uma perspectiva muito melhor na Europa. Não tenho dúvida de que essas ideias estavam na mente dos nossos amigos americanos. Seja como for, nunca se discutiu nem por um momento se a bomba atômica deveria ou não ser usada. Evitar uma vasta e infindável carnificina, levar a guerra a seu fim, trazer a paz para o mundo e cicatrizar as feridas de seus povos torturados, por meio da manifestação de um poder esmagador, ao preço de umas poucas explosões, pareciam, após todos os nossos esforços e perigos, um milagre de libertação.

O consentimento inglês ao uso da arma fora dado, em princípio, em 4 de julho, antes da realização do teste. A decisão final cabia agora sobretudo ao presidente Truman, que possuía a arma; mas nunca duvidei de qual seria ela, nem duvidei, desde então, de que foi acertada. Resta o fato histórico, a ser julgado pela posteridade, de que a decisão de usar ou não a bomba atômica para forçar a rendição do Japão nunca foi objeto de debate. Houve um acordo unânime, automático e incontestável em torno de nossa mesa; e jamais, tampouco, a menor insinuação de que devêssemos ter agido de outra maneira.

Uma questão mais intricada era o que dizer a Stalin. O Presidente e eu já não achávamos precisar de sua ajuda para conquistar o Japão. [Stalin] fora um aliado magnífico na guerra contra Hitler e ambos achamos que devia ser informado do grande Fato Novo que agora dominava a cena, embora não de quaisquer dados específicos. Como lhe darmos a notícia? Conviria fazê-lo por escrito ou verbalmente? (...) “Penso”, disse ele [o presidente Truman], “que é melhor eu apenas lhe dizer, depois de um dos nossos encontros, que temos uma forma inteiramente nova de bomba, uma coisa muito fora do comum, que achamos que terá efeitos decisivos na vontade japonesa de continuar a guerra.” Concordei com essa linha.

Fonte: Memórias da Segunda Guerra Mundial. Winston Churchill; p.1096-1098.

Nenhum comentário: